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“Os cartórios extrajudiciais são os maiores repositórios de dados pessoais do País”

Publicado em 26/10/2021

Especialista em LGPD, a advogada Laura Contrera Porto concede entrevista ao CNB/PR para falar sobre proteção de dados nos tabelionatos de notas 

Desde que entrou em vigor, em agosto de 2020, a Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGDP) tem colocado em evidência a importância de proteger os direitos fundamentais de liberdade e privacidade, além da necessidade de criar um cenário de segurança jurídica para dados pessoais mais sensíveis.

Responsáveis por um vasto banco de dados pessoais, os Cartórios de Notas se encaixam entre os órgãos e empresas que precisam se adequar à LGPD. Tendo em vista a complexidade do assunto, o CNB/PR conversou exclusivamente com a advogada Laura Contrera Porto, especialista em LGPD, para abordar como deve ser feita a proteção de dados nos tabelionatos.

Advogada, especializada em Direito Digital, Compliance e Extrajudicial, Laura Porto é sócia da Legal Protection Consultoria Jurídica. É membro do Comitê de Privacidade e Proteção de Dados da OAB-SP, além de ser coordenadora do subgrupo de Privacidade e Proteção de Dados no Setor Público OAB-SP e membro do comitê jurídico da ANPPD. É professora da pós graduação na Universidade Ítalo Brasileiro e coautora das obras: obras Dúvida Registral, Usucapião Extrajudicial e Vade mecum Cartórios 2018.

Confira a entrevista completa:

CNB/PR – Sendo um assunto que está sempre em discussão quando se fala em privacidade de dados pessoais, como explica a relevância da Lei Geral de Proteção de Dados?

Laura Contrera Porto – Podemos começar este pensamento com o fato de nunca termos antes no Brasil nos preocupado com “o que estão fazendo com nossos dados”, ou mesmo “quem está com os nossos dados e para que”. Vindo de uma forma cultural, nos acostumamos a trocar nossa biometria ou CPF por um mero desconto, sem nos aprofundarmos na finalidade real destas coletas. A LGPD vem trazer um novo paradigma ao Brasil, mostrando a importância e a necessidade de nos preocuparmos com o bom uso de nossas informações pessoais. Fato de grande relevância que cabe ser destacado ocorreu recentemente com a aprovação do PL 17/2019, onde foi aprovada a emenda constitucional, incluindo no artigo 5º a proteção de dados pessoais, inclusive no meio digital, como um direito fundamental.

CNB/PR – Com o Provimento 100 do CNJ estando em vigor desde maio de 2020, os atos notariais podem, em sua maioria, serem feitos de forma online. Nesse contexto, o que é necessário para implementar a LGPD em um Cartório de Notas?

Laura Contrera Porto – O Provimento 100 foi, sem dúvida, um divisor de águas em meio à uma pandemia mundial, mostrando ainda mais a importância das serventias extrajudiciais para a sociedade. Neste contexto, quando pensamos em LGPD, devemos lembrar que esta se aplica ao meio digital como também ao meio físico. Sem dúvida, em minhas experiências dentro dos cartórios de notas, pude visualizar que os maiores “gaps”, ou riscos, estão no meio físico. Os cartórios ainda se utilizam de muitos papéis, e a pergunta a se fazer é: como estes papéis são manuseados? Eles ficam na mesa do colaborador? Eles são guardados com segurança? Há um processo estabelecido? Diversos pontos minuciosos devem ser vistos quando pensamos na proteção de dados pessoais dentro da serventia. Exatamente por este motivo, mapear todos os fluxos de ponta a ponta é essencial.

CNB/PR – Recentemente, a Corregedoria-Geral da Justiça do Estado do Paraná publicou o Provimento nº 302, que dispõe sobre a Política de Privacidade dos Dados Pessoais para o Foro Extrajudicial. Tendo o Provimento e a LGPD, acredita que o processo de adaptação por parte dos cartórios tende a ser mais rápido?

Laura Contrera Porto – Eu creio e espero que sim. Infelizmente a LGPD não foi tratada com a seriedade devida, sendo desacreditada por muitos por não termos uma cultura de proteção de dados no Brasil. Desde que entrou em vigor, em 2020, os cartórios já estão aptos a receber demandas dos titulares e responder por possíveis problemas que podem ocorrer na serventia com os dados pessoais. Quanto mais tempo uma serventia demora para se adequar, mais propensa ao risco ela estará. Lembrando que uma adequação à LGPD é demorada devido a minuciosidade que todas as etapas requerem, o quanto antes iniciarem, melhor.

CNB/PR – Os tabelionatos possuem uma grande base de dados pessoais, com a LGPD e o novo Provimento haverá alguma mudança maior na forma de armazenamento desses dados?

Laura Contrera Porto – Os cartórios extrajudiciais são os maiores repositórios de dados pessoais do País. A quantidade de dados pessoais e, por muitas vezes, dados pessoais sensíveis que são tratados pelas serventias todos os dias, mostram a importância da adequação à lei. Todos os processos internos de uma serventia devem ser revistos e mapeados, trazendo a segurança para cada etapa. Vale ressaltar aqui a obrigatoriedade imposta pelo Provimento da Corregedoria, onde cada serventia deve ter o seu próprio “controle de fluxo” – documento que exige diversas informações, que são impossíveis de serem catalogadas sem um processo de adequação devido.

CNB/PR – A aplicação da LGPD vai alterar o funcionamento dos bancos de dados. Em relação aos cartórios extrajudiciais que utilizam plataformas online, como o e-Notariado, qual é a forma correta de fazer a gestão dos dados?

Laura Contrera Porto – Como dito anteriormente, milhões de dados pessoais circulam diariamente nas serventias. Deve-se agora se preocupar tanto com os papéis, como com o meio digital. Por exemplo, se os computadores estão em dias com sistemas e softwares de segurança; se há backup; como os dados que serão incluídos no e-Notariado estão sendo coletados; se estes dados estão de acordo com a Lei, ou Prov. 100; ou algum dado a mais é coletado?; esta coleta é feita por Whatsapp pessoal?; os dados são apagados do aparelho? Enfim, há uma lista enorme de preocupações e ações, que devem ser tomadas para evitar os riscos.

Clique aqui e confira a Cartilha Orientativa LGPD do CNB.

 

Fonte: Assessoria de Comunicação CNB/PR