Levantamento do Colégio Notarial do Brasil contabilizou 43,8 mil processos em 2020; número 15% superior ao mesmo período de 2019
Desde que começou, a pandemia de Covid-19 trouxe efeitos inesperados, para além das questões diretamente relacionadas à saúde e ao combate à doença que, só no Brasil, já matou mais de 500 mil pessoas. Nesse contexto, cresceu enormemente a procura por divórcios extrajudiciais no país. Mas, nesses casos, o que é preciso para se precaver e evitar aborrecimentos futuros? É melhor esperar, ou agir logo?
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A resposta mais simples e direta é: sim. Após a decisão do casal de se separar, quanto mais rápido se der início aos trâmites burocráticos melhor para todos. Isto porque, pelo Código Civil, o casamento representa uma série de amarras, que vinculam decisões a dois, como, por exemplo, a necessidade de autorização para venda de um bem imóvel mesmo que o casal esteja separado de fato. Só com o divórcio esse vínculo é desfeito, ou seja, nesse ínterim, ambos ficam reféns da boa vontade do outro.
Embora muitos ainda não saibam, desde a edição da Lei Federal 11.441, em 2007, é permitida a realização de separações em cartórios. Desde então, o número de divórcios vem crescendo progressivamente no país. Conforme os dados do IBGE, o aumento foi de 75% em cinco anos e, no meio do ano passado, o total saltou para 7,4 mil apenas em julho, um incremento de 260% em cima da média de meses anteriores. No Brasil, em 10 anos, o crescimento foi 63%.
O segundo semestre de 2020 assinalou o maior número de divórcios já registrados em cartórios no Brasil. Foram 43,8 mil processos contabilizados em levantamento do Colégio Notarial do Brasil — Conselho Federal (CNB/CF). O número foi 15% maior em relação ao mesmo período de 2019. A alta foi constatada em nada menos que 22 estados e no Distrito Federal. A entidade também divulgou balanço que aponta que quase 20% das separações no Brasil já são feitas por meio de cartórios de notas.
A tendência de alta se confirmou em 2021. Foram 29.985 separações nos cinco primeiros meses de 2021 contra 23.621 de janeiro a maio do ano passado, crescimento de 26,9% entre janeiro e maio. São Paulo ocupa o primeiro lugar do ranking, seguido do Paraná, Minas Gerais, Rio Grande do Sul e Rio de Janeiro.
Os dados são robustos e falam por si mesmos. Explicar os efeitos e vislumbrar as causas do tamanho da mudança que eles indicam será tarefa para sociólogos, psicólogos e historiadores, trabalho que não vai se esgotar rapidamente. De um lado, a tecnologia já possibilita a criação de startups que oferecem uma série de serviços e soluções para quem passa por um processo de separação; do outro, infelizmente, presenciamos ainda a persistência da violência intrafamiliar, que vitima historicamente principalmente mulheres e crianças.
Mas, como saber se esse é o seu caso, ou seja, se você pode fazer o procedimento desta forma e quais cuidados devem ser tomados?
Para realizar o processo em cartório, o casal não pode ter conflitos de interesses, o divórcio deve ser consensual, não deve haver filhos menores de idade ou incapazes, não pode haver gravidez e está mantida a necessidade da presença de um advogado. Desde maio do ano passado, não é necessário sequer comparecer ao cartório: o casal pode dar sequência ao processo por videoconferência. A norma, publicada pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), prevê que haja consenso entre as partes e a presença de um advogado. Uma senhora mudança, principalmente se lembrarmos que não faz tanto tempo, ainda era necessário esperar dois anos para que a separação fosse convertida em divórcio!
Em resumo, se a decisão é ponderada e consensual, não há porque adiar os trâmites relativos ao divórcio, desde que se tenha toda a cautela necessária a esse tipo de processo. A tecnologia está aí para tornar as coisas mais fáceis e menos doloridas. Ela não substitui, no entanto, a boa e velha prudência, que continua sendo a melhor das conselheiras.
* Tatiana Moreira Naumann é é especialista em Direito de Família e sócia do escritório Albuquerque Melo
Fonte: O Globo
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