Em um dos primeiros entendimentos neste sentido no país, um homem conseguiu autorização do Poder Judiciário de São Paulo para a realização de inventário extrajudicial mesmo com filhos menores de idade. Conforme a sentença da 2ª Vara da Família e das Sucessões, da Comarca de Taubaté, a partilha será estabelecida de forma ideal, sem nenhum tipo de alteração do pagamento dos quinhões hereditários, não havendo risco de prejuízo aos menores envolvidos.
No caso dos autos, a falecida deixou o cônjuge e dois filhos. Atualmente, não é possível realizar inventário em cartório em casos que envolvem filhos menores, pessoas incapazes ou conflito de interesses.
“Esse é um grande passo de melhoria da prestação de serviço público encampado no fenômeno da extrajudicialização que vai fazer com que se possa entregar para a sociedade uma prestação de serviço público eficiente”, avalia o notário Thomas Nosh Gonçalves, membro do IBDFAM cujo artigo foi citado na sentença. Confira a íntegra do texto no portal do Instituto.
Para o especialista, o entendimento é disruptivo e representa um verdadeiro rompimento de paradigmas. “A despeito de o Código de Processo Civil – CPC vedar o inventário com incapaz pela proteção e pelo papel fundamental do Ministério Público na tutela dos menores, em nada desrespeita o mandamento do CPC.”
Exigências legais
Segundo Thomas, o que ocorre é algo similar aos provimentos administrativos, já existentes em quase todos os estados brasileiros, na medida em que autorizam lavratura de inventários extrajudiciais mesmo com testamento. “Poucas unidades federativas ainda não possuem essa previsão administrativa da possibilidade de lavratura com testamento no extrajudicial.”
“O Código de Processo Civil veda também o inventário extrajudicial quando há testamento. Os provimentos versam sobre a possibilidade de uma ação de abertura, registro e cumprimento de testamento, para que por meio da intervenção do Poder Judiciário ocorra a autorização da lavratura do ato no extrajudicial. É deflagrado uma ação no judiciário, e é emitido um alvará autorizando a lavratura extrajudicial, mesmo contendo testamento”, explica Thomas. Essa matéria foi objeto do Resp 1.808.767 STJ – 15/10/19 na qual a 4º Turma de forma unânime admitiu a possibilidade.
O notário observa que, a despeito de ter menores, o extrajudicial tem sim a competência e capacidade para instrumentalizar esses atos. O que ocorre é a “deflagração de uma ação jurisdicional na qual o juiz verifica e permite a lavratura, desde que seja igualitária a partilha e o pagamento, e que não haja nenhum tipo de reposição ou alteração, conforme o princípio da saisine”.
Ele complementa: “Posteriormente, atendidas todas as exigências legais, ainda é encaminhado para o magistrado, para que dentro dos seus planos de cognição ali ele possa efetivamente aferir que foi respeitado e está tudo de acordo com o arquétipo legal, sem prejuízo ainda da fiscalização do Ministério Público.”
Nosh esclarece ainda que o fenômeno da extrajudicialização facilita e corrobora sobremaneira com os dados que hoje são disponibilizados de economia do erário. “Desde a Lei 11.441/2007, que alçou a possibilidade de lavratura de inventários, partilhas, divórcios pelo tabelionato de notas, houve uma economia gigantesca.”
“A ideia não é eliminar a atuação do Ministério Público, muito menos do juiz, mas possibilitar que eles possam trabalhar nos atos que tenham efetivamente a necessidade de avaliação e análise do caso concreto, e quando há litígio. Nestes casos a ideia é mais homologatória”, pondera.
Por fim, o especialista destaca o recente avanço no Estado do Acre, por meio da publicação da Portaria 5914-12 de 8 de setembro de 2021, que dispôs sobre a realização de inventário extrajudicial, em tabelionato de notas, quando houver herdeiros interessados incapazes. No próprio considerando da Portaria, foi mencionado o teor doutrinário dos autores, José Luiz Germano, José Renato Nalini e Thomas Nosch Gonçalves. Aqui já evoluindo a intervenção judicial jurisdicional prévia, para intervenção judicial administrativa, devendo ser apresentada minuta previamente submetida à aprovação da vara, antecedida do MP, visando a devida proteção dos incapazes – com uma verdadeira natureza de pedido de providência.
“Vamos avançar ainda mais com a extrajudicialização e o apoio ao Judiciário, sem perder a necessária imprescindibilidade da advocacia”, garante Thomas Nosch.
Fonte: IBDFAM
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