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Artigo – Reforma tributária e sucessão: por que é a hora de pensar em planejar o futuro

Publicado em 26/03/2024

A busca por planejamentos sucessórios e patrimoniais vem crescendo significativamente nos últimos anos, refletindo uma preocupação das famílias em resguardar o futuro e o patrimônio conquistado ao longo da vida. Contudo, em dezembro de 2023, essa discussão ganhou novos contornos com a promulgação da reforma tributária.

Apesar do foco na tributação do consumo, a Emenda Constitucional (EC) nº 132/2023 também traz mudanças em relação a outros tributos, como o Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCD), o que poderá impactar significativamente a carga tributária na transmissão de heranças e doações.

Como funciona o ITCD na atualidade?

Atualmente, os estados e o Distrito Federal possuem autonomia para regularem a forma de cálculo e cobrança do ITCD, desde que em observância aos limites previstos pela Constituição. Dentre tais limites, destaca-se a restrição quanto a alíquota máxima do imposto, que permanece sendo de 8%, mesmo após a reforma tributária, conforme determina a resolução do Senado vigente desde 1992.

Como regra geral, o cálculo do ITCD sobre herança e doações é feito pela aplicação da alíquota prevista (de até 8%) sobre o valor venal (de mercado) do bem ou direito recebido.

E o que muda com relação ao ITCD?

Dentre as alterações trazidas pela reforma tributária, a principal mudança diz respeito à obrigatoriedade de utilização de alíquotas progressivas em razão do valor da transmissão ou doação. Portanto, com essa alteração, quanto maior o valor dos bens objeto da herança ou doação, maior será a alíquota aplicável.

Apesar da novidade, alguns estados já previam a utilização de alíquotas progressivas de acordo com o valor do bem, como é o caso de Santa Catarina e Rio de Janeiro. Por outro lado, outros estados, como São Paulo e Minas Gerais, aplicam as alíquotas de 4% e 5% (respectivamente) para cálculo do imposto devido, independentemente do valor do bem ou direito transferido.

Nos estados que ainda não preveem a adoção de alíquotas progressivas, a edição de normas específicas sobre o tema deverá acontecer em breve. Em São Paulo, foi apresentado projeto de lei (PL) que propõe a adoção de percentuais de 2% a 8% sobre faixas que variam de 10.000 Ufesps (R$ 353.600) a 280.000 Ufesps (R$ 9.900.800,01). O PL já teve a primeira análise pelo relator e continua em trâmite na Assembleia Legislativa de São Paulo.

Contudo, não se pode esquecer que a aprovação de projetos de lei que contemplem a implementação de alíquotas progressivas pelos estados ainda em 2024 deve observar determinados princípios constitucionais.

Ou seja, quaisquer alterações legislativas (como a implementação das alíquotas progressivas) só surtirão efeito no ano subsequente à sua aprovação e após transcorrido um período de 90 dias a partir da data de sua publicação. Este ponto deve ser considerado especialmente para as implicações nas alternativas de planejamento sucessório.

Quais as vantagens da doação como mecanismo de planejamento sucessório?

O contrato de doação é um dos mecanismos mais interessantes utilizados no âmbito dos planejamentos sucessórios. Trata-se de um contrato que tem por objeto a transferência de bens ou vantagens de uma pessoa para a outra, por mera liberalidade. Os objetivos podem ser os mais diversos, podendo envolver a destinação de uma parte do patrimônio do doador para um membro específico da família ou a determinação de quais bens e vantagens serão destinados para cada membro da família.

Além disso, a doação como instrumento de planejamento pode ser bastante eficiente do ponto de vista tributário, especialmente no cenário de mudanças em que estamos. Qualquer contrato de doação celebrado antes da entrada em vigor de lei estadual que absorva a reforma tributária estará sujeito às regras atuais. Essa situação permanecerá necessariamente durante todo o ano de 2024, em razão dos princípios constitucionais mencionados anteriormente (ano seguinte + noventa dias).

Mas as vantagens não se limitam apenas aos aspectos tributários. Isso porque o contrato de doação também possibilita e antecipação da herança legítima (que se refere a 50% do patrimônio) de pais aos seus filhos. Além disso, a doação permite que uma pessoa disponha livremente da outra metade do seu patrimônio (os outros 50%), possibilitando que o doador faça transferências livres para pessoas determinadas, como por exemplo um filho específico, um sobrinho ou uma associação.

Ainda, dois outros elementos negociais também ampliam o potencial da doação como um excelente mecanismo de planejamento sucessório.

O primeiro deles é o usufruto do doador — situação em que o bem é transferido do doador para o donatário, mas o doador permanece com o direito de uso e gozo do bem. Em termos práticos, no caso de um imóvel alugado, por exemplo, os aluguéis continuariam sendo pagos ao doador (usufrutuário).

O segundo deles é a utilização de cláusulas restritivas do patrimônio, que podem gravar os bens ou vantagens doadas a critério do doador. As principais cláusulas são:

Cláusula de incomunicabilidade: o bem doado não comunicará com o patrimônio comum em caso de casamento. Assim, mesmo em caso de divórcio, o bem fica resguardado com o doador, independentemente do regime;

  • Cláusula de inalienabilidade: o bem não pode ser alienado, ou seja, o doador fica impedido de transferi-lo a outra pessoa;
  • Cláusula de impenhorabilidade: o bem doado se torna impenhorável, impossibilitando uma eventual satisfação de dívida. Nesse caso, não é possível constituir qualquer ônus ou gravame sobre o bem doado (como penhora, garantia, indisponibilidade etc.); e
  • Cláusula de reversão: a propriedade do bem doado retorna ao doador caso o donatário venha a falecer. Isso evita que o bem doado seja partilhado entre cônjuges/netos, caso o doador ainda esteja vivo.

O que se pode concluir?

A implementação das medidas propostas pela reforma tributária deverá ser acompanhada ao longo de 2024. No entanto, é inegável que esse ano se apresenta como uma oportunidade ideal para avaliar estratégias de planejamento sucessório e patrimonial, por conjugar o cenário atual (utilização do contrato de doação e as cláusulas de proteção do patrimônio) com a garantia da aplicação das alíquotas de ITCD vigentes.

Fonte: ConJur