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“A ata notarial tem recebido importância cada vez maior no ordenamento jurídico brasileiro”

Publicado em 18/01/2024

Advogado especialista em Direito Notarial e Registral fala sobre o uso da Ata Notarial como formação de prova em processos judiciais

Em tempos modernos, nos quais as formas de comunicação evoluíram drasticamente, as mídias sociais e os conteúdos nelas contidos podem ser utilizados como meio de prova em processos judiciais no Brasil.

Para tanto, a Ata Notarial – documento lavrado em Cartório de Notas – torna-se um instrumento importante para o judiciário, uma vez que é elaborada por um Tabelião de Notas, detentor da fé pública.

A utilização da Ata Notarial como meio de prova, tanto no âmbito judicial quanto extrajudicial, tem se mostrado uma estratégia excelente para que os fatos ali descritos possam ser apresentados com presunção de veracidade em processos.

O advogado especialista em Direito Notarial e Registral, Maurício Guedes, explica em entrevista ao Colégio Notarial do Brasil – Seção do Paraná (CNB/PR) as características da Ata Notarial e a relevância do ato tanto para a população quanto para o Poder Judiciário. Confira abaixo:

CNB/PR – Um dos instrumentos para fazer prova válida de alguns crimes, principalmente os que são cometidos na internet, perante o Poder Judiciário é a Ata Notarial, documento feito em Cartórios de Notas. Como a ata notarial contribui na formação de provas robustas em processos judiciais?

Maurício Guedes – A ata notarial é um dos mais tradicionais atos do notariado brasileiro. Há quem equipare, inclusive, em valor notarial, a carta escrita por Pero Vaz de Caminha, ao chegar no Brasil, narrando e documentando minunciosamente a posse da terra recém-descoberta ao rei D. Manoel I de Portugal, a uma ata notarial.

Consolidada no atual ordenamento jurídico no art. 7º, inc. III, da Lei nº 8.935/94, recebeu maior atenção do legislador processual ao ser expressamente incluída como meio de prova processual no art. 384 do Código de Processo Civil (Lei nº 13.105/2015). Segundo a redação do CPC, a “existência e o modo de existir de algum fato podem ser atestados ou documentados, a requerimento do interessado, mediante ata lavrada por tabelião”. Menciona ainda a legislação processual que a ata notarial pode, inclusive, ser constituída por “imagem ou som gravados em arquivos eletrônicos”.

Assim, embora já fosse antes admitida por alguns juízes, o documento com fé pública produzido pelo tabelião, atestando/documentando a existência e o modo de existir de algum fato, tem presunção de veracidade (juris tantum) processual, contribuindo à celeridade e segurança dos processos judiciais.

CNB/PR – Qual a opinião do senhor acerca da credibilidade da ata notarial como prova em tribunais? É bem aceita na via judicial?

Maurício Guedes – Os notários são agentes delegados do Poder Público, vinculados e fiscalizados diretamente ao Poder Judiciário. São profissionais do direito, dotados de fé pública, e que exercem a sua função com independência e imparcialidade em relação aos fatos que lhe são apresentados para a lavratura de atas notariais. Assim, diante desse conjunto de características que lhes é peculiar, são respeitados pelos magistrados, que consideram válidos e verdadeiros os conteúdos das atas que lhes são apresentadas.

É justamente em razão da confiança na higidez das atas notariais que o próprio Conselho Nacional de Justiça, com uma frequência cada vez maior, tem adotado tal instrumento como meio adequado a instruir os procedimentos de extrajudicialização, buscando desafogar o Poder Judiciário com algumas medidas. Dentre as diversas hipóteses, cita-se a expressa utilização das atas notariais para a instrução de procedimentos de Usucapião Extrajudicial (art. 401, inc. I, do CNN) e da Adjudicação Compulsória Extrajudicial (art. 440-F do CNN).

No que se refere à sua utilização na via judicial, como já apontado, atualmente encontra expressa previsão no art. 384 do CPC. E, com base nele, com frequência as atas notariais têm sido utilizadas na instrução processual das mais diversas formas. Têm sido cada vez mais comuns os casos em que os próprios juízos indicam às partes a possibilidade de produção de determinadas provas por meio de ata notarial e, inclusive, a realização de oitivas de testemunhas com a participação dos advogados das partes perante o tabelião.

CNB/PR – Desde março de 2021, a Lei Federal nº 14.132 definiu como crime a ação de perseguir alguém, sob pena de até três anos de prisão, em regime fechado, trazendo mais uma vez a ata notarial como instrumento de segurança para as vítimas. Qual a importância dessa alternativa oferecida para as vítimas? Como os casos de crimes cibernéticos são encaminhados na via judicial?

Maurício Guedes – Diante da ampla propagação do uso de aplicativos de comunicação eletrônica e mídias sociais, tais como WhatsApp, Telegram, Instagram, e tantos outros, tem sido também comum que determinadas ofensas ocorram dentro dessas plataformas, seja em texto escrito, pelo envio de áudios ou mesmo de vídeos/imagens.

Ocorre que, aliada à facilidade de obtenção de uma imagem (print de tela) desses fatos, há também uma vasta gama de ferramentas que permitem a edição/adulteração dessas imagens antes da inclusão no processual (não pelo advogado, mas pela própria parte interessada).

O risco de referida adulteração/alteração do teor contido nos aplicativos, por sua vez, é drasticamente reduzido por meio da elaboração de ata notarial pelo tabelião. Isso porque, para a lavratura da referida ata, irá o tabelião acessar diretamente o site/aplicativo/aparelho do interessado, e pessoalmente fará aferição dos fatos, na íntegra, sem interpretá-los ou resumi-los. Tem-se, assim, a certeza de que a informação que chegará à análise do Juízo competente é aquela que, de fato, na data do acesso realizado pelo tabelião, consta da rede social, aplicativo ou site eletrônico (por exemplo).

Trata-se, portanto, de ferramenta essencial às vítimas de perseguição ou de crimes cibernéticos, visto que produz prova com presunção de veracidade (juris tantum) dos fatos ocorridos, válida inclusive se o ofensor conseguir depois apagá-las. Do mesmo modo, é ferramenta de interesse dos próprios advogados que atuam na defesa da vítima, pois permite que tenham prova produzida a partir do verdadeiro teor do aplicativo/site, evitando assim que sujeitem sua atuação induzidos a erro por prova produzida de má-fé por seu cliente.

CNB/PR – Você já teve experiências práticas com a utilização da ata notarial como prova jurídica, necessária para respaldar a defesa de algum cliente?

Maurício Guedes – Em nosso escritório adotamos, com frequência, o uso de atas notariais. Por todos os fatores já apontados, entendemos que é um elemento que confere maior segurança na instrução processual e, para além disso, auxilia na celeridade do julgamento, tornando por vezes desnecessária a adoção de diligências pelo Juízo para a produção de uma prova facilmente consolidada por meio da ata notarial.

CNB/PR – Na sua opinião, quais as possíveis melhorias na utilização da ata notarial nos serviços dos cartórios?

Maurício Guedes – A ata notarial tem recebido importância cada vez maior no ordenamento jurídico brasileiro, sendo expressamente adotada como meio adequado à instrução de processos e procedimentos. Ocorre que, com o crescimento da sua utilização para os mais diversos meios, também tem havido um aumento na complexidade de diversas atas, seja em razão de seu teor/importância, seja em razão do seu tamanho/extensão (inclusive quando decorrentes de atos eletrônicos, ou quando envolvem degravações de áudios e vídeos).

Porém, e apesar do reconhecimento cada vez maior da importância deste instrumento pelo Poder Judiciário, em regra observa-se que alguns estados ainda não promoveram a proporcional adequação dos emolumentos devidos por referidos atos. Neste aspecto, com frequência o valor dos emolumentos previstos na Tabela de Emolumentos não remunera o efetivo trabalho realizado pelos tabeliães em determinadas atas notariais, em verdadeiro contrassenso ao incentivo do uso de referido ato.

Fonte: Assessoria de Comunicação – CNB/PR