A 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reconheceu, nesta terça-feira (4/11), a união estável entre duas mulheres que viveram juntas por mais de 30 anos em uma pequena cidade do interior de Goiás, mesmo sem que o relacionamento tivesse ampla publicidade. O colegiado seguiu o voto da relatora, ministra Nancy Andrighi, que defendeu a necessidade de adequar o requisito da publicidade à realidade de casais homoafetivos, sobretudo em contextos de discriminação social.
O caso foi julgado no Recurso Especial 2.203.770. A ação foi proposta por uma mulher que buscava o reconhecimento da união estável com sua companheira falecida há cinco anos. A Justiça de primeira instância havia negado o pedido, sob o fundamento de que o relacionamento não atendia ao critério de publicidade previsto no artigo 1.723 do Código Civil.
Durante o julgamento, Nancy Andrighi afirmou que negar o reconhecimento da união estável homoafetiva por falta de publicidade, quando comprovada uma convivência contínua, duradoura e com laços familiares, seria “invisibilizar uma camada da sociedade já estigmatizada que muitas vezes recorre à discrição como forma de sobrevivência”.
Segundo a ministra, “é possível, sim, a relativização do requisito da publicidade para a configuração da união estável homoafetiva, desde que presentes os demais requisitos previstos em lei”. Ela destacou que a exigência deve ser interpretada à luz dos princípios constitucionais da isonomia, da dignidade da pessoa humana e da liberdade sexual e de intimidade.
Os ministros Daniela Teixeira, Moura Ribeiro e Ricardo Villas Bôas Cueva acompanharam integralmente o voto da relatora. Daniela Teixeira classificou a decisão como “um dos votos mais sensíveis e necessários” vistos no tribunal nos últimos anos.
O subprocurador-geral da República Humberto Jacques de Medeiros também participou da sessão e sugeriu a substituição do termo “relativização” por “adequação”, explicando que o conceito expressa de forma mais precisa o entendimento de que a publicidade em uniões homoafetivas deve ser interpretada conforme o contexto social e histórico de cada relação. A relatora acolheu a sugestão.
“Talvez eu esteja realmente usando mal o termo, porque relativizar pode ser entendido como eliminar o requisito. O correto é adequar o critério da publicidade à realidade de quem viveu sob discriminação”, afirmou Nancy.
Fonte: Jota
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